sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

LER-SE EM OUTROS LIVROS

"Pois para eles o amor era de ordem superior. Rímini o imaginava como um lugar pequeno e bem aquecido, forrado de tapetes, com as paredes recobertas de livros, onde os estremecimentos do mundo só entravam traduzidos para o dialeto povoroso que era a língua local. Salvo por algum toque oriental - tapetes também nas paredes, volutas de fumaça perfumada saindo de algum lugar, cortinas para dividr ambientes, uma sensação geral de abarrotamento tóxico - que em sua fantasia era mais pronunciado, imaginava-o exatamente como a sala que compartilhava com Sofía. Não, não lhe faltava imaginação. Mas sabia reconhecer a eficácia do real. Por que representar se de outro modo a ordem do mundo vivia nele, envolvido nele, se esse era seu meio ambiente cotidiano e podia descrevê-lo de memória, até o menor detalhe, sem se equivocar? E no entanto era real? Essa era a pergunta com que os amigos mais céticos acabavam sempre por desafiá-lo. Rímini olhava para eles perplexo, como se a pergunta o transformasse automaticamente numa criatura de uma espécie muito exótica e depois só conseguia perguntar: Está falando sério?"

( "O Passado" - Alan Pauls )

Um comentário:

Amanda Meirinho disse...

não, vai um pouco além de tapetes na parede, camafeus, essas coisas que enchem a casa de ácaros. no amor, você acaba é mais parecida com a outra pessoa do que pode imaginar.